Isabela Chusid, fundadora da Linus

Luiza Terpins
No Corre
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11 min readApr 25, 2021

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Depois de estagiar em algumas multinacionais, a paulistana resolveu empreender e criou uma marca de sandálias que une design, sustentabilidade e conforto

Quem

Isabela Chusid, 26 anos, fundadora da Linus, marca de lifestyle que vende sandália ecológicas. Sou paulistana da gema (falo muito "meu!") e formada em Administração de Empresas pela FGV — muito por não saber o que fazer na época.

Como boa capricorniana, estou sempre em busca de estabilidade. Quero ganhar dinheiro não pelo luxo, mas pela segurança e para ter uma vida estável. Também não abro mão de roupas confortáveis e sou uma pessoa bem espontânea — talvez mais do que deveria. Às vezes falo coisas sem pensar, o que não deixa de ser bom para quebrar o gelo.

Outra característica é que sempre fui voltada para sustentabilidade. Acredito muito que educação ambiental é o caminho. Com mais ou menos 4 anos de idade eu aprendi sobre reciclagem e perguntei para minha mãe se a gente reciclava os materiais em casa. Depois de ouvir que não, consegui que o prédio começasse a reciclar. Eu também era aquela criança que quebrava o pau com vendedoras de lojas que vendiam casacos de pele. Eu dizia que elas precisavam saber como aquelas peças eram feitas. Minha mãe ficava louca.

O que fazia antes

Durante a faculdade eu fiz estágio na General Electric, na área de Sales Support dentro de Global Operation. Foi uma experiência engraçada, porque eu não tinha muitas tarefas. Eu respondia direto para o CEO Latam, que era um canadense. Ele só tocava projetos grandes e não tinha muita coisa para me passar. Meu dia-a-dia era em inglês, o que era interessante, mas por outro lado eu era zero desafiada (às vezes eu cochilava por 2 horas e ninguém sentia falta rs).

Quando saí, meu então chefe me deu dois conselhos: arranje um emprego em que você use inglês e faça um trainee. Acabei indo para a BRF, que apesar de não ir de encontro com meus valores, foi onde tive uma chefe incrível e que me ensinou muito. Lá, eu lidava com reposição e exposição de produtos em países do Oriente Médio como Arábia Saudita e Kuwait.

Quando eu estava próxima de me formar, pensei "putz, preciso me inscrever em um programa de trainee", mas já tinha perdido o período de inscrição de quase todos. Consegui participar dos processos da própria BRF e da Red Bull. Dei tudo de mim para conseguir passar nesse último e deu certo.

A empresa era super legal, mas entrei para a área comercial, que não tinha muito a ver comigo. Em três meses eu já estava meio angustiada, chorando no banheiro, e comecei a tentar descobrir o que poderia ter o meu perfil– afinal, já tinha passado por empresas brasileiras, internacionais, grandes, pequenas, e nada até então havia feito meus olhos brilharem.

Em paralelo, comecei um curso de redação publicitária da Miami Ad School porque sempre gostei de escrever, mas sem a pretensão de trabalhar com publicidade. Em seguida, resolvi fazer coach.

Na minha segunda sessão, ele falou "Isa, eu só vou continuar te atendendo se você pedir demissão da Red Bull. Você precisa ficar um dia na sua vida sem saber o que vai fazer no dia seguinte. Precisa de ócio criativo". E assim foi. Larguei o trainee no meio e minha família quis me matar — mas óbvio que eu tenho um super privilégio de poder fazer isso.

Depois de três meses, o coach me chamou para trabalhar na empresa dele de treinamento e desenvolvimento de pessoas. Foi legal pois comecei a estudar programação neurolinguística, comunicação, relações interpessoais e a desenvolver algumas soft skills. Mas eu ainda me sentia subaproveitada e oito meses depois eu saí.

Quando deu o click de que era hora de empreender?

Minha família inteira é empreendedora, mas eu sempre achei que isso não era pra mim. Por outro lado, eu já havia passado por indústria, bens de consumo, serviço, e em nenhuma eu tinha me encaixado.

Até que eu identifiquei um problema e comecei a pensar em como resolvê-lo.

Na época em que trabalhei com o coach, era tudo home-office e eu costumava ficar muito de chinelo Havaianas ou descalça e isso começou a me causar dor nos pés. Fui ao ortopedista e descobri que tinha uma frouxidão ligamentar. Basicamente eu precisava usar calçados que tivessem curvas de apoio para os pés para dar uma melhor sustentação. Era um saco, porque eu sempre fui muito despojada – quando era para me arrumar, colocava tênis Vans (para desespero da minha mãe, que sempre foi das bolsas, sapatos e maquiagem) – e agora tinha de me preocupar com palmilhas e etc. Fiquei pensando "o que eu vou usar no dia a dia já que não posso usar chinelo?"

Para mim, era fundamental que o sapato tivesse 1) sustentação, 2) design bonito e despojado e 3) que fosse sustentável. Quando ia procurar, esse último elemento sempre ficava de fora. Foi aí que percebi que poderia haver uma demanda e senti o bichinho do empreendedorismo me picar.

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Quais foram os primeiros passos para transformar a ideia em realidade?

Fui pesquisar e vi que de fato havia demanda. Isso foi em abril de 2018 e a minha ideia era lançar no Natal daquele mesmo ano. Aliás, esse foi um input do meu irmão. Ele disse “você tem que colocar uma data limite, senão vai ficar postergando sempre.”

Comecei a procurar designers de calçados que tivessem experiência em calçados injetados e encontrei um fornecedor do Rio Grande do Sul que, por coincidência, estava em São Paulo para uma feira. Fui lá correndo encontrá-lo e fechamos o negócio. Era para ele me entregar desenho 2D, desenho 3D, maquete, me ajudar a escolher material, enfim, várias coisas, e ele não me entregou quase nada — por sorte no contrato eu pagaria por entrega.

No final, quem desenhou foi meu noivo, que não entende nada de calçados mas desenha bem e tem ótimo senso estético. Ele fez o design do logo, desenhou a fivela e os detalhes da sola.

Essa primeira experiência como um todo foi muito importante para eu entender a cadeia produtiva (que eu não tinha noção). Precisei ir atrás de tudo sozinha e enfrentar pepinos com fornecedor às vésperas do lançamento — mas que no final deram certo porque no meio do caos encontrei uma fornecedora incrível que inclusive está fixada no topo do meu WhatsApp de tanto que me ajuda.

Tudo isso acabou sendo uma grande lição de que, por mais controladora que eu seja, tudo tem seu tempo e as coisas às vezes não acontecem na forma que a gente espera. Empreender é resolver 15 problemas para surgirem outros 30.

Na época do desenvolvimento, bati um papo com o Amit Eisler, um dos fundadores da Zissou [leia o nocorre com ele aqui], e ele me deu um conselho que eu levo para a vida: lance um produto mesmo que você tenha vergonha dele. Se achar que está perfeito, você não deveria estar lançando, e sim já escalando.

Dito e feito. Fizemos 900 pares porque tinha uma tiragem mínima de produção e rolaram vários problemas e reclamações — tanto, que paramos de vender na metade e reciclamos o que sobrou. Mas no final das contas foi ótimo porque identificamos as causas, corrigimos na matriz, enviamos novos pares para quem tinha comprado e fidelizamos esses clientes. Essa foi a primeira experiência que tive com a importância de ser transparente com a comunidade.

Na época, o quarto do irmão, que já não morava mais em casa, virou estoque — depois foi tudo para a casa do meu pai. Passei também a deixar várias caixas no carro (era a minha loja móvel) e a participar de feirinhas. Fazia tudo sozinha, incluindo as levas para os Correios.

Em fevereiro de 2019 trouxe duas estagiárias freelancer para tocar as redes sociais (tenho um pouco de preguiça dessa parte) e em março fizemos nossa primeira venda em atacado para a Ahlma, marca do grupo Reserva — detalhe que foi bem na cara de pau: mandei mensagem dizendo que amava a marca e que meu produto tinha tudo a ver. Eles fizeram uma encomenda de 200 pares de uma vez e foi uma loucura para montar as caixas, etiquetar, entender como emitir a nota fiscal e enviar.

No meio do ano, como a empresa já gerava lucro desde o primeiro dia e eu era muito cautelosa com as despesas, resolvi alugar um escritório. Em setembro, a Olívia, uma das estagiárias, entrou de vez para tocar a parte de branding e conteúdo e em seguida contratei uma pessoa para ajudar na logística, pois eu já não estava dando conta sozinha de organizar os pedidos do site (volta e meia me viam no meio da avenida Faria Lima correndo e quase sendo atropelada para deixar as caixas nos Correios que ficava lá perto).

Com as meninas do time em 2019

Em março de 2020, pouco antes da pandemia começar, trouxemos uma pessoa para tocar a parte comercial de atacado. Aí entramos em quarentena e, claro, as vendas de atacado caíram para zero.

Nisso, nosso digital já era muito bem estruturado e começou forte a tendência de loungewear, que são roupas e acessórios com estilo e conforto. Como temos um produto que dá para usar em casa, as vendas no site cresceram bastante mesmo durante a pandemia. Fora isso, em maio passamos a vender no site da Amaro. também.

Foi aí que comecei a sentir a dor do crescimento. A gente não tinha estrutura e não estava conseguindo entregar para os clientes a experiência que gostaríamos. Contratei pessoas para as áreas de growth, logística e compras e em setembro de 2020 mudamos o escritório para uma casa no bairro de Pinheiros, onde também funciona uma pequena loja conceito.

Terminamos o ano com um time de 10 pessoas. Eu nunca tinha gerenciado ninguém, foi desesperador, mas falava para todos que estava tudo bem. Nunca cresceu tanto cabelo branco em mim como nessa época rs.

Ainda nessa loucura, aconteceu um fato interessante: em um único dia, vendemos o que era previsto vender durante todo o período de Black Friday.

Para dar conta de tudo, fechamos o site no meio de dezembro, mas aí as pessoas começaram a fazer fila na porta do escritório para comprar. Era quase que um esquema fast-food: uma pessoa preparava o pedido e outra entregava. Foi uma correria muito legal para validar que tínhamos 1) encontrado um ponto bom para o escritório; e 2) que as pessoas queriam tanto uma Linus que estavam dispostas a tentar comprar pessoalmente já que o site estava fechado.

Hoje, temos sandálias em seis tamanho e 11 cores — 9 de linha e 2 edições limitadas que fizemos em parceria com o Canal Off. Minha irmã trabalha com moda e me ajudou nessa parte, mas também somos muito próximos dos clientes e fazemos pesquisas. Incentivamos o consumo consciente, por isso temos cores fáceis de combinar, mas temos clientes que gostam de fazer coleção e já estamos com alguns lançamentos previstos para esse ano.

Como é um dia de trabalho?

Começo a semana com reunião de alinhamento de 1h, 1h30 para entender os projetos que temos para os próximos dias. Sou controladora, mas dou autonomia para o time — contratar time é viciante, é um alívio enorme poder delegar tarefas.

Como eu disse, até fundar a Linus eu não tinha tido experiência em gerenciamento de pessoas, então me preocupo também em desenvolvê-las e sou muito aberta a aprender. Busco incentivar as meninas a questionarem bastante.

De resto, tenho muitas calls, faço o fechamento financeiro (sou a louca das metas) e dedico uma parte do meu tempo a pesquisa de tendências.

O que você costuma fazer nas horas vagas?

Quando você empreende, fica difícil separar hora de trabalho e hora de lazer. Eu sou bem de boa e muito caseira. Conto as horas para chegar a noite e assistir filmes e séries comendo pipoca doce.

Também amo dormir, ler, ficar com a minha cachorra e praticar algum esporte para ajudar na saúde mental. Às sextas-feiras, respeito o Shabbat [dia de descanso no judaísmo que começa ao pôr do sol de sexta-feira e termina no entardecer de sábado]. É bom que acaba sendo um momento para desconectar.

O que te ajuda a ser mais produtiva?

Uso o Slack integrado ao Asana. É tudo na vida. Só fica atrás do meu caderno — gosto de colocar no papel o que preciso fazer no dia seguinte para priorizar tarefas. Isso é algo que passo para as meninas do time.

O que te move?

Depois de 2 anos e meio, descobri o meu propósito como pessoa e empreendedora. Ultimamente, tenho visto marcas grandes copiando a gente, seja no produto ou na comunicação, e de início achei que fossem nos engolir, mas agora entendo que isso mostra que estou indo no caminho certo e que mesmo sendo uma marca pequena temos um poder de influência muito grande. Ou seja: eu preciso ser melhor para fazê-los melhores.

Então o que me move atualmente é ser sustentável para que as grandes marcas também sejam — e, consequentemente, termos um futuro melhor em termos ambientais.

Já como empresa, nosso grande propósito é transformar o bem estar em estilo de vida. Acreditamos que se o mundo não está bem, você não está bem.

Quais são os maiores desafios de empreender na sua área?

O Brasil ainda é atrasado em termos de matéria prima sustentável, então convencer fornecedor a desenvolver alguma coisa é difícil — e estar sempre inovando dentro desse cenário, também.

Outros desafios que tenho: embalagens (o preço está bizarro); gerenciar pessoas e manter a sanidade mental neste período rs.

Quais são seus próximos passos?

Não enxergo a Linus como uma marca de calçados, e sim de lifestyle. Quero consolidar isso e torná-la referência global. Já começamos a exportar para Portugal e a ideia é expandir ainda mais.

Um conselho a quem deseja tirar uma ideia do papel

Tenho três. O primeiro é aquilo que o Amit Eisler me aconselhou no início: lance seu produto ou projeto mesmo tendo vergonha dele. Em segundo lugar, saiba que empreender é estar no corre todos os dias, não tem muito glamour. Por fim, mantenha sua estrutura a mais enxuta possível.

Quem você gostaria que participasse dessa seção?

Meu irmão, Alan Chusid, fundador da Spin Pay; a Sharon Hayfaz, fundadora da Nuó; a Giovanna Bessa, fundadora da Strappy Co; e alguém da Água na Caixa, empresa que conheci recentemente e achei muito legal.

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Sobre o nocorre:

Oi, aqui é a Luiza Terpins, criadora do nocorre. Desde 2018 eu bato papo com pessoas que estão na correria para fazer um projeto acontecer e conto aqui suas trajetórias e bastidores. O meu corre atualmente é na Além, onde sou co-fundadora e head de conteúdo. Antes, fui head de comunicação no iDEXO by TOTVS e jornalista na revista da GOL (Trip Editora). Você também me encontra no Linkedin e no Instagram :)

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