Henrique Azeredo, fundador do Patties

Luiza Terpins
No Corre
Published in
10 min readMay 9, 2021

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Após não se identificar com o meio corporativo, ele seguiu sua paixão por hambúrguer e fundou o Patties, hamburgueria de sucesso em São Paulo

Quem

Henrique Azeredo, 32 anos e "papai do Patties", hamburgueria fundada em 2019 para resgatar a origem dos primeiros burgers americanos. Nasci em São Paulo, sou filho do meio de pais separados e irmão coruja.

O que fazia antes

Eu fiz faculdade de marketing e trabalhei por 4 anos com administração de shopping centers, uma área muito tradicional e difícil de inovar. Com o tempo, ficou muito claro para mim que eu não sou um cara da planilha e de usar terno, sabe?

Meu avô era poeta, ajudou a fundar a poesia concreta, e acho que puxei dele esse lado criativo e rebelde. Sou muito sensível e espontâneo. A minha mãe, a Dona Ju, sempre nos criou com muitos princípios e quando entrei no mercado de trabalho tomei um choque de realidade.

No meu primeiro dia, mandei um e-mail todo feliz para a equipe e logo recebi uma resposta da minha chefe dizendo que ela não tinha gostado da minha atitude. Comecei a ter de pensar mil vezes antes de escrever um e-mail ou falar alguma coisa e percebi que os chefes querem sempre melhorar o profissional, mesmo que para isso tenham que mudar o jeito dele. Eu senti que não podia ser eu mesmo e isso me incomodava. Acordava todo dia com vontade de chorar e me achando um incompetente.

Eu sabia que se eu montasse um negócio um dia, a última coisa que eu gostaria é que o pessoal se sentisse assim.

Quando deu o click de que era hora de empreender?

Em 2018, na época da Copa do Mundo, eu resolvi sair do meu emprego porque não estava feliz. Fiquei um mês no sofá achando que tinha feito merda.

Aí, um dia, ouvindo a música "Chamado", do meu irmão mais novo Fabio Brazza, comecei a pensar no trecho em que ele pergunta "o que te faz vibrar?". Na hora pensei em hambúrguer, algo pelo qual sou apaixonado desde criança — quando era menor e me comportava, a minha mãe me levava ao Mc Donald's.

Na época eu tinha R$ 40 mil guardados, o que não era muito para abrir um negócio, então decidi que iria virar chapeiro, mas pelo menos ia trabalhar com hambúrguer. Comecei a mandar mensagens para donos de hamburgueria perguntando se eles topariam uma conversa e, conforme eu encontrava esse pessoal, me decepcionava um pouco. Eu chegava todo empolgado perguntando como eles tinham encontrado aquele pão, e os caras mal sabiam quem eram os fornecedores.

Foi então que decidi dar um jeito de abrir uma hamburgueria. Como eu já não tinha uma autoestima muito boa, de cara pensei que se eu investisse mal aqueles R$ 40 mil, iria acabar com a minha vida. Seria a comprovação de que eu sou um loser. Então quanto melhor eu me preparasse, mais chances teria de acertar o alvo — no caso, de dar certo. Comecei a estudar igual a um camelo para empreender quando eu me sentisse pronto.

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Quais foram os primeiros passos para transformar a ideia em realidade?

Por conta da minha experiência trabalhando com shopping centers, eu tinha acesso a muitos materiais. Estudei o que eram as ondas, as modas e as tendências.

A onda, por exemplo, é a paleta mexicana, que sobe e desce. Já a moda perdura mais um pouco, como o hot dog gourmet, por exemplo; e tendência é algo que vem para ficar, são comportamentos que vão perdurar pelas próximas décadas.

Eu queria fazer um negócio que fosse relevante por muito tempo. Hoje, as pessoas tendem a querer ingerir calorias de forma mais consciente. Então eu sabia, por exemplo, que o meu burguer não poderia ser aquele que tem calorias para dois dias inteiros.

Eu também identifiquei que as pessoas sentem necessidade de curtir mais momentos offline e tranquilos, então nós temos em mente a ideia de comer na praça curtindo a família. Enfim, fui fazendo correlações com essas tendências e com o que eu também acreditava — não adianta nada tirar do papel algo que você não acredite só porque está na pesquisa, né.

Eu listei tudo aquilo que poderia me fazer quebrar e, para não correr riscos, fui atrás de aprender sobre esses assuntos: coifa, arquitetura, barreiras mentais que pudessem impedir clientes de entrarem na loja…

Acho que o Patties deu muito certo porque eu amo muito hambúrguer e faço tudo isso de coração, mas os estudos foram essenciais. Fiz cursos como o de futurismo na Aerolito, assisti palestras e li muitas pesquisas da WGSN.

Levei quase um ano para abrir porque eu tive o privilégio de poder fazer tudo com calma, desde procurar sócio a desenhar o logo e escolher as embalagens da forma como eu gostaria. Tive muita ajuda da minha mulher, que enquanto isso bancou a casa, e da minha família — a minha mãe às vezes trazia umas compras de supermercado e meu pai emprestava o cartão.

Nesse meio tempo falei com Deus e o mundo — de mil pessoas, 20 responderam. Procurei pessoas que trabalhavam com hambúrgueres e tive mais desânimo do que ânimo. O pessoal falava para eu desistir, dizia que era furada. Eu fiquei noites sem dormir achando que tinha estragado a minha vida (e muito dessa ansiedade eu trago até hoje e sinto que preciso tratar).

Até que um dia vi que tinha sido aberta uma hamburgueria nova chamada Guarita Burger e que diziam ser muito boa. Fui lá com a minha mulher experimentar e fiquei louco. Precisava falar com os donos (Jean Ponce e Greigor Caisley). Mandei mensagens, fui atrás e eles me receberam. Foram os únicos que viram o meu projeto, contei toda a história e eles toparam entrar já que o investimento não era tão alto.

Fiquei animado, criei grupo no WhatsApp, mas os caras não me respondiam. Eu mandava mensagem de bom dia e nada [risos]. Aí, marquei uma nova conversa e perguntei se eles estavam dentro mesmo, porque os boletos já estavam chegando, e eles disseram que eu podia mandar para eles pagarem. Como os dois já tinham o Guarita Bar e o Guarita Burguer, o tempo deles era corrido, então eu que acabei tocando tudo sozinho no início, até que eles começaram a se apaixonar pelo Patties e hoje o pessoal do Guarita até reclama que não vê mais o Greg por lá.

No total abrimos o Patties com R$ 180 mil — já contando fluxo de caixa. Foram R$ 90 mil meus (pedi emprestado para a minha mulher, para a minha mãe e para a minha madrinha); R$ 45 mil do Greg e R$ 45 mil do Jean.

Inauguramos a primeira loja em 1º de abril de 2019 no Brooklin, em São Paulo, e em três meses já paguei quem tinha me emprestado.

Hoje temos 3 lojas e 6 dark kitchens, que são as cozinhas para delivery via Rappi. Em fevereiro deste ano vendemos mais de 400 mil hambúrgueres e antes da pandemia as pessoas faziam filas enormes para comer.

Muita gente acha que o Patties é de fora, inclusive já ouvi clientes na fila comentando que comia Patties "na gringa" e que estava feliz que tinha chegado ao Brasil [risos]. O Mc Donald's, o White Castle e a White Manna são grandes referências e fontes de inspiração, mas nem o cardápio e nem a arquitetura são as mesmas.

Já recebemos 16 propostas de empresas e fundos querendo comprar o Patties, mas nenhum com fit com a nossa cultura e missão.

Eu, que sempre fui inseguro e me achei incompetente, estou feliz da vida, porque não pretendo ter 3 carros na garagem e nem passar o final de semana com o Neymar. Quem foi que disse que a métrica do sucesso é a margem de lucro? O que eu quero mesmo é ser feliz.

Em cima, da esquerda para a direita, duas cenas que nos inspiraram; embaixo, duas cenas que aconteceram em lojas Patties

Como é um dia de trabalho?

É meio amador [risos]. Cada hora estou em um lugar, e onde me chamarem eu vou. Eu tento me organizar melhor, já tive burnout e ainda sofro com isso. São muitas mensagens, muitas ideias. Acabo fazendo de tudo e achando que não estou fazendo nada. Cuido do marketing, já atendi em lojas, respondo mensagens no Instagram…

O que você costuma fazer nas horas vagas?

Há pelo menos 2 anos eu não venho sendo um bom filho, bom esposo e bom neto. Minha avó diz que eu mudei. Como eu não sei falar "não", acabo não tendo tempo para nada e só quero dormir. Mas quero melhorar isso e ter mais tempo para a minha família, para o meu cachorro Mc (de Mc Donald's), para viajar e fazer exercícios.

O que te ajuda a ser mais produtivo?

Sinto que eu não sou muito produtivo quando estou com a agenda cheia ou sob pressão. Se eu tenho uma reunião às 8h30, por exemplo, antes disso eu já estarei aflito. Meus momentos de produtividade e criatividade vêm aleatoriamente. Às vezes estou vendo TV, tenho uma ideia e saio para trabalhar nela.

Esse é sempre o primeiro cliente de todas as lojas que abrimos

O que ou quem tem te inspirado?

Minhas referências estão sempre em movimento. Gosto de estar onde as pessoas estão, então vejo TikTok e acompanhei o BBB, por exemplo.

A Juliette, que ganhou essa última edição, me inspirou muito com sua inteligência emocional. Eu concordo muito com ela quando disse que precisamos acreditar mais nas pessoas. Eu mesmo já fui roubado por funcionários próximos e tento não mudar meu jeito por isso. Nessas horas, lembro de outras pessoas, como o fornecedor nos móveis da primeira loja Patties (que também fornecia para o Shopping Iguatemi). Eu queria fazer com ele, mas ia pagar em, sei lá, 60 parcelas. No final, ele chegou para entregar e falou "meu, vou dar de presente para você porque sei que você vai levar esse ato adiante."

Em breve vamos inaugurar o Projeto Vizinho, que é a portinha colada na nossa loja de Pinheiros. Selecionamos um empreendedor para assumir o espaço e vamos dar toda assessoria jurídica, financeira e de negócios, além de 6 meses de aluguel. Conseguimos parceiros que doaram a cozinha para ele. Tem muita gente que é foda mas que não tem networking e o know-how para fazer as coisas acontecerem e é muito importante que quem tem, ajude como pode.

Um conselho a quem deseja tirar uma ideia do papel

Parece clichê, mas não é: seja você mesmo para atingir seu maior potencial. Se não, provavelmente não vai conquistar as melhores coisas. Pensar assim mudou a minha vida.

Por um tempo o estoque de embalagens era na minha casa

Quem você gostaria que participasse dessa seção?

Eu queria muito saber do que vive, do que se alimenta e o que pensa a herdeira do seu Oswaldo, do Hamburguer Do Seu Oswaldo, lanchonete no Ipiranga. Eles não pensam em vender nunca? Nem 1% para o Henrique, só para eu morrer feliz?

Na época do seu Oswaldo eu era criança e agora crescido eu só consigo falar com atendentes. Eles dizem que todo mundo já tentou comprar a lanchonete. Eles não estão no delivery! Eu queria entender quem está por trás e saber o que move eles. A filha nunca apareceu, nem sei se existe, mas eu amo o hambúrguer e queria morrer sabendo que eu fui sócio nem que seja com 0,01%. Amo de paixão mesmo.

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Sobre o nocorre:

Oi, aqui é a Luiza Terpins, criadora do nocorre. Desde 2018 eu bato papo com pessoas que estão na correria para fazer um projeto acontecer e conto aqui suas trajetórias e bastidores. O meu corre atualmente é na Além, onde sou co-fundadora e head de conteúdo. Antes, fui head de comunicação no iDEXO by TOTVS e jornalista na revista da GOL (Trip Editora). Você também me encontra no Linkedin e no Instagram :)

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